O fruto proibido, por André Vasconcelos
A trajetória milenar da maçã revela como lendas e acasos moldaram tradições culturais, religiosas e gastronômicas

Diz a Bíblia que Adão e Eva foram expulsos do Paraíso por terem comido o fruto da Árvore da Ciência … a Árvore “do conhecimento do bem e do mal”.
Talvez a culpa desse cancelamento do casal raiz tenha sido da serpente que resolveu colocar um pouco de pimenta na monótona relação.
Ou talvez a culpa seja da Eva que decidiu criar um regime à base da fruta… certamente a primeira dieta da história!
Ou até do Adão que, sem futebol e sem cerveja, andava depressivo e para se animar, criou o pecado original acabando com a monotonia… e, claro, colocou a culpa na cobra e na maçã, afinal, os homens sempre terceirizam suas culpas!
Como poderiam imaginar que uma simples maçã iria fazer tanto estrago!!!!
Esta fruta é tão antiga quanto a história da humanidade: pesquisadores dizem que ela existe desde o final da era glacial, há mais de vinte e cinco mil anos, e é originária de algum lugar próximo ao Cáucaso, um pouco mais ao norte de onde julgam ter sido o Jardim do Éden.
De lá ela se espalhou pelo mundo permeando inúmeras estórias, lendas e mitos em civilizações distintas, muitas vezes sendo sua base alimentar.
Estudos apontam que a macieira foi a primeira árvore cultivada pelo ser humano, e já fazia parte da alimentação do povo de Jericó, a cidade mais antiga do mundo.
Alexandre, o Grande, rei da Macedônia, trouxe de suas viagens ao Oriente, mudas de uma espécie anã, resistente ao inverno, e a partir da Grécia do século IV a.C., espalhou-se por toda a Europa tornando-se um dos principais alimentos da época, lembrando o tomate e a batata ainda não eram conhecidos.
Quando Colombo chegou na América, de onde vieram os tomates e as batatas, vikings e piratas já haviam trazido macieiras para Groenlândia e Canadá, e já era um fruto permitido no Novo Mundo.
Médicos do século XVI indicavam maçãs cozidas como remédio e no século seguinte os camponeses europeus produziam a sidra, um vinho à base de maçãs.
E sendo tão antiga e tão presente em todo mundo, nada mais justo do que fazer parte da culinária típica de vários povos.
Na Europa Central a maçã é o purê que guarnece muitas carnes gordas.
Na Holanda o médico Maximilian Bicher-Brenner ralou e secou maçãs que, misturadas a oleaginosas e flocos de arroz, fez o müesli, o pai de todas as granolas.
Na Alemanha o apfelstrudel é mais conhecido que a bandeira nacional!
A American Apple Pie, a torta de maçã que não foi inventada pelos americanos, é o maior ícone daquela gastronomia sem graça, a ponto de ter um ditado popular que diz: “tão americano quanto uma torta de maçã”!
A torta de maçã, americana como conhecemos, teve origem na Inglaterra a partir de influência culinária francesa e holandesa que fizeram uma releitura de umareceita oriunda do Império Otomano!
Sabendo disso, a mais original maçã americana talvez seja o iPhone, e mesmo tendo como símbolo a maçã, a american technological apple é basicamente chinesa.
Mas na minha opinião de cozinheiro, de quem aprecia o simples e bem feito, o sabor real de cada alimento, a combinação perfeita de acidez/doçura/gordura, a francesinha Tarte Tatin é a campeã entre as tortas de maçãs!
Sua receita, diz a lenda, surgiu de um erro!
Stephanie Tatin, uma das irmãs que comandava o Hotel Tatin no Vale do Loire, de tão atarefada, levou ao forno as maçãs às metades, intercaladas com manteiga e açúcar, esquecendo da sua base.
Quando deu por si, cobriu a forma com a massa e levou de volta ao forno!
Servida quente e caramelada, é a prova definitiva que em gastronomia o menos é mais, e que um erro pode ser fatal, mas pode ser um grande acerto.
Eva errou e nos demos mal... Stephanie errou e nos demos bem... essas são algumas das muitas lendas do fruto proibido!
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Sobre o autor

André Vasconcelos
Cozinheiro raiz e autodidata, hoje no comando de sua Cozinha Singular Eventos e d'O Vilarejo Hospedaria e Gastronomia, onde insumos e técnicas são a base de cardápios originais e exclusivos... e aprendiz de escritor também!
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